quarta-feira, 22 de junho de 2011

O Joaquim tinha uns óculos. Grandes e pretos. Pareciam óculos normais mas não eram. Eram muito especiais. Com aqueles óculos o Joaquim via tudo cor-de-rosa. Se tirava os óculos não via nada. Se punha os óculos via tudo cor-de-rosa. Ou nada ou rosa. Não lhe agradava mesmo nada isso. Preso no labirinto do rosa. E não eram só as revistas ou as panteras que ele via cor-de-rosa. Era tudo. O Joaquim pensou que talvez fosse dos óculos. Trocou de óculos vai para mais de 5 vezes e nada. Cor-de-rosa 5 vezes. Várias tonalidades de cor-de-rosa é verdade mas sempre cor-de-rosa.

Não foi sempre assim. O Joaquim via as cores todas no início. No início e no meio. Da vida. Da sua vida, claro. Que ele não se segue pela vida dos outros. Era o que faltava. Foi a dada altura que começou a ver tudo cor-de-rosa. E se bem se recorda nem foi numa altura em que mudou de óculos. Claro que não tem a ver com os óculos. Tem a ver com ele. Mas o Joaquim bem dá voltas à cabeça mas não chega lá. Não consegue perceber porquê.

O pior é que com o cor-de-rosa o Joaquim ouve uma musiquinha de fundo. Como se a sua vida de repente passasse a ter banda sonora. A principio começou a ouvir uma música ao longe. Pensou ser algum vizinho ou música na rua. Mas não. Deitou-se a ouvir a música e acordou a ouvir a música. Ora não podia ser um vizinho a ouvir sempre a mesma música. O Joaquim ficou para morrer. Primeiro o rosa depois a música. Mas começou a perceber que a música era a sua música preferida. Aquela que mais gosta de ouvir quando está bem. Aquela que o faz abanar a cabeça. Que o faz sorrir para o mundo. Mesmo que esteja cor-de-rosa. Principalmente quando o vê cor-de-rosa.

Finalmente o Joaquim percebeu que tinha sido ele a escolher o rosa. E a música. Já lhe tinham dito que ele podia ver a vida como muito bem entendesse. Mas ele não acreditou. Ele achava que a vida tem as cores que tem. E que ele tinha de a aceitar assim e mais nada. Mas começou a desconfiar que aquela ideia lhe tinha ficado na cabeça e que finalmente ele tinha feito uma escolha. Não foi preciso nenhum acontecimento solene e importante. Não foi preciso nenhuma frase marcante. Nenhum empurrão de ninguém. Um dia aconteceu. O cor-de-rosa e a música. E agora o Joaquim vive feliz com a sua escolha. Afinal a rosa sempre foi a sua flor preferida.